Laurel Halo | Quarantine

Laurel Halo

Quarantine

[Hyperdub; 2012]

8.0

ENCONTRE: iTunes

por César Márcio; 27/06/2012

Um atestado de como as coisas andam insanamente rápidas (ou só insanamente, se preferir) na indústria musical é esse pequeno debate sobre o quão divisor é o PRIMEIRO long play de Laurel Halo. Sim, leitores, o primeiro disco cheio de um artista anda sendo considerado por jornalistas como um divisor de águas. Tudo bem, poderia ser um divisor de águas na história da música (não é)… A celeuma é realmente sobre uma suposta mudança radical nos padrões (que padrões?) de uma artista que lançou até agora apenas dois EPS. O que seria essa mudança tão radical? ELA CANTA!

Incrível, não é mesmo? Não. Esse é o aspecto menos importante sobre “Quarantine”. Laurel Halo, além de simbiose artística com Julia Holter, contemporânea com o mesmo interesse nessa música feita em camadas sintéticas (esta com menos foco em ambiência), parece uma artista alinhada com os ensinamentos de Laurie Anderson, Kate Bush e Elizabeth Fraiser, o que explica a opção pelos vocais e pelo comportamento deles durante o disco (em especial, com as duas primeiras).

Para entender melhor a motivadora e a discussão sobre sua voz, é imprescindível passar pela experiência que é ouvir a peça central do álbum, o single “Carcass”. A imaginativa transição entre o início analógico rústico direcionado ao krautrock de um Tangerine Dream para procedimentos eletrônicos mais “anos 90” é pontuada por inserções vocais que beiram a estridência. E aí gente acostumada a ouvir o que quer (é difícil entender que não é assim que a arte funciona?) se mostrou incomodada com a opção pelos vocais. Na realidade, o aspecto humano adicionado pela maneira como a voz é captada (com pouca ou nenhuma intervenção eletrônica, por opção estética da artista) reforça ainda mais o conceito do álbum que, embora alegadamente não conceitual, remete a um embate entre tecnológico x biológico (“Quarantine”, “Airsick”, “Tumor”, etc…).

Sendo assim, a opção é só mais um detalhe da topografia acidentada das paisagens desenhadas por Laurel Halo. Existem pontos onde o vocal se adere a melodia esparsa (a abertura “Airsick”, o encerramento comedido “Light + Space”), mas o relevo é quase sempre marcado pelos pontos onde voz e melodia colidem (a dupla formada por “Years” e “Thaw” é uma prova de fogo para o ouvinte). Esses pontos de tensão são reforçados pela pouca coisa de literal que existe aqui mas não há como negar que eles são melhor articulados por música. Por isso, é mais provável que o ouvinte se sinta desconfortável com o beat epilético de “Morcom” do que exposto a letra “difícil” de “Tumor”.

O mais importante sobre “Quarentine” não fala sobre divisão, ressaltando o quanto uma observação desse tipo acerca de uma artista sem nenhum LP lançado é ridícula. “Quarantine” é, ao contrário, evolução: existe algo daquela mulher (um pouco menos interessante, é verdade) obcecada pelas estruturas do synth-pop dos anos 80 em “Hour Logic”, mas tudo aqui é mais intrigante e complexo. Existe tanta informação para ser descoberta em “Quarantine” que o desconforto com a voz de Laurel Halo é insignificante. É apenas mais um.