Yo La Tengo | Fade

O Yo La Tengo sempre teve uma aura de heroísmo, seja por sua alegada ética artística, por incorporar o arquétipo indie (veja o clássico clipe de “Sugarcube”) ou, simplesmente, pela sua grande influência no rock alternativo americano após os anos 90. Mas vê-los agora, com quase 30 anos de carreira ininterrupta e discografia de regularidade impressionante, sugere outro tipo de heroísmo, mais literal. Mesmo entre as maiores divindades da música pop, dificilmente uma carreira desse tamanho não gera desavenças, brigas, idas e vindas ou pontos onde cansaço e preguiça dão o tom. Só para ficar entre seus pares, temos exemplos recentes como o fim do R.E.M., reunião do Dinosaur Jr. e o hiato do Sonic Youth. Já o Yo La Tengo parece voar entre os mortais, fugindo de brigas e, principalmente, de discos ruins. O décimo terceiro, “Fade”, investe no lado mais gentil do trio para mantê-los nesse trilho.

Dessa maneira, não há como fugir de comparações com “Summer Sun”, disco de 2003 e de proposta semelhante. Existe outro disco com humor compatível, o bom “The Sounds of Sounds of Science”, mas nele a preferência por longas jams escapistas o afasta da concisão de “Fade”. Aqui, aquelas longas passagens com guitarra em protagonismo que chegam a bater os 10 minutos, presenças constantes desde “May I Sing With Me”, ficam de fora. Talvez consequência da presença de John McEntire (Sea and Cake/Tortoise) na produção que, embora longe de mudar a essência do YLT, trouxe novos elementos (cordas e sopros) para complementar a obsessão de Ira Kaplan por guitarras.

Mesmo sendo um disco marcado pela sutileza, eventualmente o trio pontua o novo álbum com faixas mais agressivas, como o crescendo velvetiano em “Ohm” e, com destaque, “Stupid Things”, lembrando a maravilhosa “Barnaby, Hardly Working” em sua polirritmia. No geral, como indicado, o tema é inverso, caracterizado pelo Yo La Tengo clássico ouvido em “Well You Better”. A mão de McEntire pode ser sentida principalmente na delicada “Cornelia and Jane” (uma canção perfeita para o Sea and Cake) e no número final, o quase épico “Before We Run”. Embora pequena, a canção que resume com maior clareza as intenções do trio aqui é “The Point of It”, modesta como é, em música e poesia resignada.

Os temas e o clima de “Fade” sugerem que o casal de ouro do indie rock, 29 anos dividindo palcos, representa a própria vida em música. O inicio mais rudimentar e referencial nos anos 80, a auge na segunda parte dos anos 90, a maturidade nos anos 2000 e, finalmente, a placidez de “Fade”, encenam uma inconsciente evolução natural que explica porque, depois de tanto tempo, muita gente ainda se identifica com essa pequena banda de New Jersey. Não há heroísmo, na verdade: se identificam porque talvez esses dois sejam um dos poucos artistas na música pop que transparecem humanidade.