A Caetano Veloso, este parágrafo-inicial-quase-carta-aberta:

Caetano, seus álbuns ao vivo são incríveis. É admirável ouvir artistas que entendem como, para além do vendável, este tipo de registro é valioso. Você sempre entendeu isso. Em “Circuladô Vivo”, “Black And White”, de Michael Jackson, introduz seu famoso gesto-rap, no caso, de “Americanos”; em “Totalmente Demais”, é engraçadíssimo ver a platéia rindo com os versos da canção que dá título ao álbum e era hit do ano na voz do grupo Hanói Hanói (afinal, do que eles riam? Minha geração não consegue saber); “Noites do Norte (Ao Vivo)”, talvez o melhor nesse quesito da sua discografia, traz uma versão espetacular do álbum já espetacular que a gravação de aplausos deu gênese. Eu poderia citar milhões de exemplos (em “Zii e Zie (MTV Ao Vivo)” tem “Água”, do Kassin +2, grupo que tanto te influencia e a velharada nem consegue saber quem é, tem Mautner em “Manjar de Reis”, em “Prenda Minha”, tem uma versão definitiva de “Drão”, do Gil, e seu filho e seus percussionistas em “How Beautiful Could Being Be”). Mas, veja só, é para este público que nada disso sabe que o seu staff (é assim que gente chata classifica quem é da equipe) redireciona um show que nasceu tão bonito, jovem e vital no Circo Voador. Não fora bonita aquela noite, Caetano?

Por qual motivo você acha que existem registros deste show completo no You Tube? Casualidade? Falta do que fazer? Não. Gostaríamos daquele show em repetições. Você suava. Sem camisa, rebolava — e não era um filme pornô no qual um decadente gaga setentão conquista alguma novinha paga. Não. Era você, um artista brilhante, sendo artista. E assim sendo para novinhos que muito a contragosto foram te ver em uma patética casa de shows. Onde a luz da tela do WhatsApp, camisetas feias com o seu rosto em stencil feio custavam mais que o próprio espetáculo, uísque e frases como “ele não toca nenhuma que eu conheço, gente!” se misturavam irritantemente. Caetano, a gente não te reconhece mais fora do palco. E nem queremos saber mais o porquê disso tudo. Você tem dinheiro demais, é adorado demais, deve estar C&A para isso tudo e para essa opinião. O que é contraditório e um tanto desesperançoso para muitas pessoas que aprenderam a ter esperança – inclusive a de só pensar que é muito maneiro admirar alguém brilhante (não há nada tão brilhante quanto ficar feliz com alguém que é). Há dois Caetanos. O do palco e o que é empresariado. Em algum momento, seria até interessante saber se você realmente não se envergonha da Paula Lavigne falando do Queremos Saber, do seu DVD com Ivete Sangalo e Gilberto Gil, de você falando do Fora do Eixo. Mas não. Você tem uma obra tão filhadaputamente melhor que estas merdas que daria uma preguiça tremenda, sabe, correr atrás dessas respostas. Você não seria tão claro quanto é nas palavras que as fazem ser obras de arte. Continue Caetano de palco e de estúdio. A sua parte artista fora dela não existiu nos últimos episódios. E o Vivo Rio só reforça tudo isso.

Agora, sinta-se à vontade para ler a nossa crítica para “Multishow Ao Vivo: Caetano Veloso – Abraçaço”