Entrevista: Juliano Gauche

O cantor e compositor Juliano Gauche finalmente lançou o que vinha se desenhando desde que São Paulo retornou-lhe Tatá Aeroplano, Peri Pane e Junior Boca. Desde que chegou à capital paulista, o ecoporanguense foi acumulando canções e amigos novos. Os que não entraram em “Veneza”, suposto terceiro álbum do Solana (saiba mais), estão presentes em carne, osso e composição em seu álbum homônimo de estreia. Juliano, quase sempre, foi urgente e denso em suas composições e interpretações. Seja no último disco do Solana (o ótimo Feliz, Feliz), seja em uma canção como “O Interior de um Edifício Debaixo do Mar” ou interpretando ferozmente canções de Sergio Sampaio.

DOWNLOAD Juliano Gauche – “Juliano Gauche”

“Tenho evitado pensar no Solana”, confessa Gauche. Dor e confusão se misturam com a felicidade da estreia. Em parceria com o Musicoteca, Gauche lança agora suas canções acompanhado dos novos paulistanos. Enquanto você baixa o disco (link acima), leia o papo que batemos com o cantor e compositor:

Fita Bruta: Você encontrou abrigos (e amigos) novos em São Paulo depois de ter vivido alguns momentos de reconhecimento em Vitória. De Ecoporanga pra Vitória deu Solana. De Vitória pra São Paulo este “Juliano Gauche”. Este disco é resultado exclusivo do que você encontrou em São Paulo?

Juliano Gauche: Sim. Este disco é um fruto direto do meu contato com a cidade e os músicos de São Paulo. Quando sai de Ecoporanga a idéia era ir direto para Rio ou São Paulo, mas o tempo em Vitória se estendeu e minha relação com a cidade se intensificou mais do eu esperava. Mas no fundo, eu sempre esperei a hora chegar ao eixo Rio- São Paulo para começar a falar sério. Sempre encarei minha vida em Vitória como uma espécie de estágio. Agora me sinto exatamente onde gostaria de estar.

FB: Antes mesmo de vir morar em SP você já vinha flertando com Tatá Aeroplano, com o Cérebro. Ele é um dos pais da criança? O que o Tatá possibilitou em “Juliano Gauche”?

JG: O Tatá Aeroplano se tornou meu grande parceiro neste disco. Todas as nossas conversas em torno da obra do Sérgio Sampaio, do mercado atual, da filosofia de viver de música permearam a construção deste disco. Quando terminei de gravar o Veneza com o Solana, eu convidei ele para produzir minha nova empreitada. Isso foi muito natural. Já estávamos afinados e ele sabia exatamente o que eu precisava. Então ele montou a banda, convidou o Junior Boca para produzir com ele, armou todo o meio de campo pra mim, e assim fizemos tudo.

“Dediquei 20 anos da minha vida à banda e sinto que não consegui levá-la onde eu queria. Tudo que vem do Solana pra mim é confuso e doloroso”

FB: As prévias de “Veneza”, quase-terceiro álbum do Solana, indicavam um também quase-rock rural. Você se desgarrou dos processos de “Veneza” para esta tua estreia ou os dois discos se relacionam? 

JG: São discos bem diferentes. Tenho muita dificuldade em definir os dois, mas os acho bem diferentes. E gosto dos dois da mesma forma. Embora sinta um tipo de grandeza peculiar neste novo; uma energia diferente, nova, clara…

FB: Afinal, “Veneza” sairá um dia? Dá pra conciliar duas ansiedades artísticas?

JG: Tenho evitado pensar no Solana. Dediquei 20 anos da minha vida à banda e sinto que não consegui levá-la onde eu queria. Tudo que vem do Solana pra mim é confuso e doloroso. Sai como quem não se reconhece mais dentro da própria casa. Mas ainda assim, tudo que estiver ao meu alcance para fazer com que o três discos da banda cheguem ao máximo de pessoas possíveis, eu farei. Tenho muito orgulho de tudo que gravamos.

FB: Voltando. Ano passado você se apresentou no Centro Cultural Rio Verde. Em um ano tudo mudou ou só foi um processo de ajustar as composições?

JG: Deu tudo errado. Tudo que eu estava fazendo, estava dando errado. Tive que parar tudo, reorganizar toda a proposta. Só depois que a Sil Ramalhete (minha mulher) assumiu a produção executiva do meu trabalho e o Tatá Aeroplano a produção artística, é que as coisas se alinharam melhor.

FB: Suas letras sempre me pareceram muito urgentes. Por isso, fortes muitas vezes, como “O Interior de Um Edificio Debaixo do Mar”. Em “Juliano Gauche” em que pé esta urgência está? Mais densa ou mais explícita?

JG: Mais densa e mais explícita. Eu vivo achando que vou morrer a qualquer momento. É uma espécie de doença paranóica que eu não consigo administrar. Algumas vezes eu acho que nem vivo, só morro mesmo. É uma ótica estranha que está em tudo que eu escrevo. Então tudo sai assim, como se fosse uma tentativa de esclarecer as coisas para as pessoas ao meu redor, antes que eu não possa dizer mais nada.

FB: Roberta Martinelli [apresentadora do programa de TV/You Tube “Cultura Livre”] me confessava rindo de uma certa e, segundo ela, bonita fragilidade tua durante a apresentação no programa dela. Do teu nervoso. Você está lançando um disco com teu nome, são tuas dores e vontades ali. Representar a si mesmo para ti próprio e para uma gama de desconhecido é ainda um processo sensível pra você?

JG: Eu sou um desses casos de pessoas que não se sentem à vontade no mundo. Este nervosismo é constante, em casa, na rua, nos bares, nas entrevistas, nos shows… Só me sinto à vontade no plano feérico, no mundo abstrato das canções, nos sonhos… Fora disso nunca encontrei um lugar neste mundo que não me deixe trêmulo e fragilizado. E neste caso não há o que representar, tem ser e pronto.

FB: Você teve descobertas recentes e díspares. Tatá lhe apresentou Jupiter Maçã, “Nada Será Como Antes”, do Milton, te deu um riff para uma música, você é apaixonado por Sergio Sampaio. Qual foi a última descoberta que te influenciou gravemente?

JG: Sixto Rodriguez.