Hot Chip | In Our Heads

Hot Chip

In Our Heads

[Domino; 2012]

8.2FITA RECOMENDA

ENCONTRE: Site Oficial

por Rafael Abreu; 20/06/2012

O Hot Chip, à maneira do Beach House, nasceu com a cronologia meio zoada. Porque, ao contrário dos mil primeiros discos que são lançados, hypados e descartados diariamente na famigerada blogosfera, seus discos de estreia não eram tanto promessas quanto obras apenas bastantes de visões completas, seguras, sombras que apareciam antes mesmo que seus donos fossem claramente divisados. Não havia necessidade de “formação”, de amadurecimento. Já estava tudo lá.  “Coming On Strong” e “Beach House” eram, então, discos de bandas que nasceram “prontas”, mas acabaram entregando, logo no debute, álbuns na escala errada: realizavam a genialidade que lhes cabia em tamanho miniatura, timbres diminutos e canções menores (não confundir com canções pequenas). “Saltwater” e “Master of None” eram preciosistas e assombradas por fantasmas tristemente bondosos,  “Bad Luck”, “Playboy” e “Down With Prince” eram frutos de nerds tristonhos, sacanas (“Fuck you, you fucking fuck”) divertidos e, de certa maneira, meio zuões, compositores e músicos de altas habilidades e baixíssimos níveis de sisudez. Como se disse antes: estava tudo ali. Um ajuste, duas adequações, três fuxicadas e o que o Hot Chip e o Beach House já deviam ter em mente desde sempre seria devidamente “traduzido” pelo som que fariam. Daí os segundos discos deles serem saltos enormes e, no entanto, familiares.

Convenhamos: não é pouca coisa.

Tudo isso pra dizer que o Hot Chip tem realizado, em linhas gerais, facetas diferentes de um mesmo projeto. “Coming On Strong”, “The Warning”, “Made In The Dark”, “One Life Stand” e, agora, esse “In Our Heads” são discos de um conjunto obcecado em explorar e assegurar um domínio completo sobre si mesmos, em afinar cada vez mais e das mais diferentes maneiras a própria voz com a própria garganta. Nesse processo obstinado, Alexis Taylor, Joe Goddard e companhia entregaram trabalhos repetidamente sólidos e repetidamente derivativos, para falar de um termo que raramente é empregado com muita inteligência – o que aplicam à descrição (não-crítica) negativa da banda X ou Y que se utiliza de uma linguagem já existente, sem perceber que a questão se trata menos de linguagem do que de espírito e mais de projetos falhos que discos que não alimentam a roda das novidades. Se for para entrar nessa lógica, aliás, o único disco pejorativamente derivativo que o Hot Chip lançou foi seu primeiro, o que não deixa de ser uma declaração insuficiente. Dali em diante, o que se viu e ouviu foi uma banda pegar emprestada de si mesma tudo que precisava para ser relevante, interessante e fresca, para não dizer simplesmente “nova”, em sua constância e familiaridade.

O título de “In Our Heads” (“Em nossas cabeças”), aliás, é uma declaração óbvia do caminho da banda, um disco que, como os outros, segue uma receita: três, quatro, cinco canções excelentes, sendo o resto uma espécie de filler de primeira categoria, faixas que não são tanto encheção de linguiça quanto músicas “apenas” boas. O carro chefe, então, fica a cargo de “Don’t Deny Your Heart”, uma espécie de versão de “Wanna Be Starting Something”, “Night and Day”, uma ameaça de brinquedo robótica e saltitante, “Flutes”, a beleza eletrônica mais solene e angustiada do disco, e a devoção pra pista de dança de “Let Me Be Him”. Tudo isso com o que o texto, até agora, decidiu não especificar: a voz do Hot Chip.

E o que essa voz é é justamente a união de sabe-se lá quantas vertentes de música pop, ocasionalmente apresentadas como se fossem antagônicas, reunidas em só ponto, em uma só perspectiva. O melhor do Hot Chip é que eles conseguem ser impetuosos, indulgentes, preciosistas, calculados, lépidos, ameaçadores, inteligentes, familiares, inaugurais e modestos frequentemente na mesma faixa. Daí suas melhores músicas serem equações em que cada um desses adjetivos – e, sem sombra de dúvida, outros, ainda – se organizam de milhares de formas diferentes em torno de canções de techno, soul, rock, eletropop ou disco music mutante, aqui mais celebração, ali mais tristeza, acolá mais seriedade.

Dito isso, “In Our Heads” é mais do (excelente) mesmo. Música pop sem burrice, som dançável sem masturbação, disco interessante sem ser maçante. Hot Chip, vocês fizeram de novo.