Kindness | World, You Need A Change Of Mind

Kindness

World, You Need A Change Of Mind

[Female Energy/Polydor; 2012]

5.2

ENCONTRE: iTunes

por Rafael Abreu; 26/04/2012

Faz três anos que o Kindness surgiu no meu radar, no já longínquo ano de 2009. Com um nome impossível de se jogar no Google e uma identidade bastante obscura, Adam Bainbridge ganhava fama, basicamente, por duas faixas: um cover eletro-etéreo de “Swingin’ Party” (The Replacements) e o pequeno freak out de baixo autoral que é (e era) “Gee Up”. Duas canções relativamente disseminadas, à época, e o Kindness se tornava uma pequena promessa que, no entanto, nunca chegou a se realizar, até agora. Pois não demorou muito até que o Kindness simplesmente “sumisse”.

É por isso que é quase uma surpresa que esse “World, You Need A Change Of Mind”, estréia cheia do projeto, esteja realmente “acontecendo”. Após um período de poucas (ou quase nenhuma) linhas sobre o que Adam andava fazendo, o disco surge quase de sobressalto. E o artista também volta mudado. Quando começou a aparecer, Adam era o tipo de músico de que a maioria das pessoas ainda não via com desconfiança: a “proposta” lo-fi, ainda que seja difícil (e meio triste) tratar um efeito de gravação como o grosso da identidade de uma banda, ainda não tinha se saturado de mil noise-poppers e a chillwave só começava a despontar. A atmosfera chiada e de quarto das duas faixas que levaram a fama do Kindness, portanto, ainda não corria o risco de ser ouvida com desdém. Três anos mudam muita coisa, e Adam não parece imune a isso. O videoclipe promocional do disco, com uma nova versão quase igual, mas mais polida, de “Gee Up”, parece ser um indicativo. São menos de dois minutos de música, com mais dois minutos de “bastidores”, em que se vê, entre outras coisas, um homem explicar que gosta da faixa porque se trata de “Lo-fi com valores hi-fi.” O que é, convenhamos, uma frase de efeito bem bestinha. O que se pode dizer, traduzindo um vocabulário publicitário como esse, é que “World, You Need a Change of Mind” é um disco de música retroativa, a repaginação de gêneros antigos. Sons, então, “datados”, fortemente associados a determinada época, não necessariamente parados no tempo. O tipo de coisa que todo mundo faz, hoje em dia, de Hercules and Love Affair a metade do povo do glo-fi.

Pois bem, o que se ouve na estréia de um moleque fashion de vinte e poucos anos que faz música antiga – disco music, house primitiva, funk sensual e um bocado de no wave. É o tipo de coisa que o Larry Levan discotecaria, se tivessem o “inventado” nos anos 2000: dance music ligeiramente esquerda, esquisitinha. Música que se dança ao som de, mas cuja criação envolve uma pista de dança hipotética, cuja dança é imaginária.

Apesar de todas as influências que coleciona, “World, You Need…” é um disco sem muita voz, por boa parte consistindo no produto “de série” de admiração hipster por ostentação (“Olha como eu sou descolado”) baseado em uma sensibilidade de ouvinte impressionável. As ambiências do disco e as cafonices que se permite, embora rendam frutos relativamente funcionais, como a ternura de “Swingin’ Party” e a radiofonia pós-punk funkeada de “It’s Alright”, (in)distinguem o álbum como um trabalho de índices, indicativos. Um trabalho, enfim, de superfície, cuja função imediatista, descartável, só é realizada em poucas faixas, a saber “Gee Up”, “Doigsong” e “Cyan”, todas músicas pra rebolar, além da já citada “Swingin’ Party”. Há Prince, há Levan, há a Nova Iorque dançante do fim dos anos 1970, há até Gang of Four (“It’s Alright”), mas há também uma dose perigosa de indefinição, de ambiências automáticas e de um senso disforme de música de homenagem, a maioria do campo do mais ou menos. “World, You Need a Change of Mind” é um disco que, embora queira um bocado, dificilmente comove, te aprofunda – te move.