Leo Leobons | Bá

Em um ano em que a ligação musical Brasil–África foi centralizada e subvertida nas figuras paulistas de Kiko Dinucci e Thiago França, trabalhos como o de Leo Leobons, que à primeira impressão deveriam se beneficiar da visibilidade do Metá Metá e afins, não receberam tanta divulgação quanto poderiam ou mereciam. Isso, contudo, não interfere, de forma alguma, na grandiosidade e excelência de “Bá”.

Talvez por não realizar experimentações com gêneros mais receptivos como o rock ou por se aproximar somente à primeira vista dos timbres e da clareza de produção geralmente ligados à MPB, Leo Leobons tenha ficado num espaço musical limítrofe e absurdo, aquele entre o que se considera ser MPB e o que seria música independente no Brasil. A despeito dessa discussão infrutífera, “Bá”, que em iorubá significa algo como encontrar, reunir ou juntar, faz com excelência o que se pretende: encontrar, reunir, juntar os ritmos, os timbres, os cantos, enfim, as culturas africana, cubana e brasileira.

Apesar da abertura intensa de “Cartão de Visita“, “Bá” é mais contemplativo e menos direto do que seus pares mais discutidos em 2013. Privilegiando muito mais a percussão, dada a imensa e clara habilidade de Leobons para os arranjos percussivos, todo o disco é pontuado com ruídos eletrônicos que pouco interferem na dinâmica das canções, mas que as trazem para um terreno mais moderno e contemporâneo, sem forçação de barra, contudo. A junção de cantos de cultos de raiz africana, sejam cubanos ou brasileiros, a esses ruídos, teclados e guitarras faz de “Bá” uma experiência musical em sua maioria nova e renovadora. Leobons, com arranjos suaves mas relevantes – o que chama-se comumente de ‘refinados’, vai além da pesquisa e apresentação musicais do que poderia ser considerado apenas folclórico. “Babá Didê“, por exemplo, é uma das faixas que demonstra com facilidade a intenção e a excelência do projeto desenvolvido pelo cantor, compositor e músico, onde a reunião de guitarras, percussão, iorubá e ruídos se faz de uma maneira suave e harmoniosa, sem estranhamentos.

Sendo tão bem concebido e executado, seria de se admirar o fato de Leobons e “Bá” não terem encontrado maior repercussão em 2012. Entretanto, ainda que “Bá” seja bom e interessante, trata-se de fato de um disco menos urgente, que pede um tempo mais específico para ser fruído. Ao contrário, por exemplo, de um disco de riffs e solos como “MetaL MetaL“, mais imediato e inclusivo. É curiosamente nos momentos em que “Bá” busca mais essa “inclusão” do ouvinte médio, ou a urgência descrita antes que “Bá” se mostra mais fraco e dispensável, como em “Exuberância” ou “Desencabula“, as duas últimas faixas do disco, também curiosamente.

“Bá” é nesse sentido melhor quando é mais contemplativo, como falei anteriormente. Mas “Bá” também é mais contemplativo do que outros discos com inspiração ou influência africana em outro sentido da palavra: o místico. “Bá” é mais devotado e devoto, mais ascético à música por assim dizer religiosa. Um disco com essa intenção, e que é praticamente cantado na íntegra em iorubá, oferece uma óbvia resistência aos ouvintes menos interessados. Todavia, quem se aventura na experiência de “Bá” de fato encontra um disco que vale a dedicação de escutá-lo, especialmente quando ele se permite a contemplação que exige do ouvinte.