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É curioso que chame-se “Novo Recife” o empreendimento que instalará requintes de modernidade e crueldade no Cais José Estelita. O que chama atenção nessa tentativa é exatamente o mesmo problema que faz sucumbir muitas outras investidas nos campos artísticos: o artifício do “novo”. Aqui, o termo significa um calaboca no sublime e estimula a percepção em um credo de que “antigo”, “desconhecido” e até mesmo o “tosco” devem ficar em um mesmo balaio etiquetado “ultrapassado”.

Voltando: é ainda mais curioso entender os pernambucanos do Mombojó como atentos a toda sorte de novidade de timbres e parafernalha de plugins e, ao mesmo tempo, vê-los engajados nos movimentos que circundam defensivamente os que resistem em Estelita. É um alívio, na verdade. Tal engajamento extrapola a briga em si e acaba invadindo o espírito de “Alexandre”, quarto álbum de ineditas do quinteto.

Por isso, não necessariamente há uma revolta explícita nas letras e nem deve haver uma preocupação do ouvinte em captar diretas ou indiretas que possam ser endereçadas a algum incompetente órgão público. Fosse assim, o fracasso de “Alexandre” seria de início não lhe permitindo conquistas. E por ser o maior dos lançamentos recentes da banda, o álbum dá vida justamente aos antecessores.

Antes de “Alexandre”, uma lembrança de algo que é impossível esquecer: o Mombojó já foi chamado de “remelento” pela Veja. O texto não é assinado. Uma pena. Pois, apesar do tom bobo, a matéria estava correta em alguns pontos. Mas, no geral, colocava Teatro Mágico, Móveis Coloniais e Mombojó em um mesmo barco confuso entre mercado e estética. Destes dois conjuntos os pernambucanos nunca se aproximaram — ainda seja certo que encontraram fãs do além-mainstream seduzidos em um primeiro momento pelos barbudos.

http://veja.abril.com.br/080807/p_138.shtml
Reprodução/Veja.com.br

À época de “11º Aniversário”, extra da discografia do Mombojó, eu dizia que a banda “talvez nunca tenha sumido, mas o Mombojó precisa chegar novamente”. Dizia também que o disco era um “mal necessário”. E funcionou exatamente assim. “Alexandre”, pois, é o segundo capítulo de um recomeço — e como esperado, é uma evolução de uma banda que não arranja-se mais como era em “nadadenovo”, de 2004, e “Homem-Espuma”, de 2007. Da família de “Alexandre” é “Amigo do Tempo”, de 2010 — e é um primo. Todos os adjetivos aos integrantes  feitos no texto de “11º Aniversário” se encontram ainda mais verdadeiramente aqui.

“Rebuliço” e “Me Encantei Por Rosário” são faixas maiores da discografia da banda porque consistem em uma não necessidade maior do que serem músicas. E esta tentativa (ou contra-tentativa) está permeada no disco. Não há mais solução, não há mais crítica, não há mais venda de álbuns, não há mais novo-Los Hermanos, novo-Mundo Livre. Não há o novo. Há o que sempre existiu nos direitos autorais do Mombojó: o temporário, o fade out. Tão temporário quanto as armações que fazem barulho no ouvido de pessoas quando o vento forte bate, tão temporário quanto são as causas sociais de quem realmente é causa e consequência de uma mesma cidade.

“Alexandre”, por isso, pode ser dançante sem que possa deixar de ser preocupado; é enérgico sem que se assemelhe a uma ação policial. E, de bônus, ainda concedeu à banda um possível novo encerramento de show que é “Pro Sol”, de refrão dobrado e gritado — e  que pode substituir “Deixe-se Acreditar”, do primeiro álbum.

Há ainda participações de Dengue, CéU e Laetitia Sadier — todas como se fossem estabelecidas ao álbum de forma orgânica, não se anunciando. Não à toa, todos já possuem raízes no Mombojó. Do conterrâneo baixista que já gravou uma música do Mombojó em “11º Aniversário”, passando pela cantora que já esteve no registro de 2007 (em “Tempo de Carne e Osso”) e de Sadier, vocalista do Stereolabs, conjunto idolatrado há tempos pelos pernambucanos.

Os remelentos seguiram sempre por perto, falando pouco e habitando sozinhos uma cidade bem diferente de Recife. Agora, com “Alexandre”, pode ter chegado o tempo de novos e definitivos territórios — e que sejam os primeiros novos e definitivos de muitos lugares que a banda já provou poder chegar. Mas é somente agora, mais de dez anos depois do início da banda, que o luxo de permanecer em algum deles é possível.

“Alexandre”, a canção de Caetano Veloso, parece ser a melhor biografia de Felipe S., Chiquinho, Marcelo Machado e Vicente Machado. E por extrema coincidência: o nome do álbum não veio por inspiração no Grande, mas sim em uma frase de teclado que dizia “Are You Sure?”.

Ele nasceu no mês do leão, sua mãe uma bacante
E o rei seu pai, um conquistador tão valente
Que o príncipe adolescente pensou que já nada restaria
Pra, se ele chegasse a rei, conquistar por si só.
Mas muito cedo ele se revelou um menino extraordinário:
O corpo de bronze, os olhos cor de chuva e os cabelos cor de sol.