Maga Bo | Piloto de Fuga (Part. BNegão e Funkero)

É grave: pouca gente se tocou que o brasileiro ainda insiste muito mal no rock. Muita gente só toca, infelizmente. E toca um vazio absurdo. Então, não me admira que o funk carioca e o rap (no sudeste, principalmente) passem a ser os verdadeiros representantes da música brasileira no século XXI.

Estamos na segunda década e já não é tão difícil ver isto – e separar fenômenos efêmeros dos duradouros. Se ao passarmos por 1999 vimos o funk carioca aparecer no Gilberto Barros, na novela, no trio elétrico, assim também o vimos como destaque em 1990 ou em 2012. Do brega ao rap, a mesma coisa.

E, claro, não nos admira que a melhor música de 2012 será de qualquer um desses ritmos. Mas nenhum deles com estará com guitarra em mãos. Ao menos é o que eu espero, desejando que este contraste vá se tornando cada vez mais nítido na música daqui.

Escrevi sobre “9 Círculos”, de Emicida, justamente porque ela revigora o gênero a qual pertence. Mas, além disso, supera alguns traumas e tem por mérito ter sido escrita para um jogo de videogame sem soar como música pra gringo. Pelo contrário, é São Paulo, é Kassab, é rap brasileiro (não “nacional”).

Uma das minhas favoritas neste ano é “Piloto de Fuga”, música do álbum “Quilombo do Futuro”, do DJ e produtor americano Maga Bo. Sim, americano e você pode saber mais na resenha que fiz do disco. Por enquanto, o importante é: Maga Bo revigora a composição de Funkero (de 2008) e, acrescentando a grave e esporrenta voz de BNegão, compõe um daqueles hits que não estarão nas rádios (para azar das rádios).

Resenha MAGA BO – “QUILOMBO DO FUTURO”

Com exceção da ausência da batida padrão de 2012 (o tchum-tcha a capella que figura em quase todos os hits do gênero), “Piloto de Fuga” reúne com extrema qualidade o que ela já era: efêmera, situacional, direta, dinâmica. A produção de Maga Bo é interessantíssima se comparada à original presenta na mixtape de Funkero: alta, pesada, com detalhes a cada virada (existem diversos ótimos samples pela música), com BNegão.

A fuga presente em cada funk é um objeto quase metalinguístico aqui. É uma dentro da outra. Talvez você se pergunte: oras, mas a reclamação não era justamente um certo “vazio”? Sim. Porém, aqui – e no funk como um todo, há implicitamente o entendimento de “vazio”. Torna-se, então, conceito. Ao contrário do discurso pretensioso (e esvaziado) do rock – ritmo que, no Brasil, até os 80s carregou algumas gerações. Depois, jamé.

Tente se lembrar da melhor faixa de rock deste ano. Impossível. O máximo que você vai conseguir é lembrar de uma guitarra do disco do Curumin, da Tulipa ou de qualquer outro artista que não se contenta mais em ser rock. Tenta ser tudo ao mesmo tempo. Um exercício modernista que o funk aprendeu desde que surgiu traduzindo canções do miami bass. Maga Bo e “Piloto de Fuga” provam que o exercício continua.

A letra, inclusive, deveria ser um hino dessa metalinguagem toda. “Nóis capota, mas num freia/Comédia fica bolado (…) e se tu num toca brabo é melhor num tentar não” seria um ótimo trecho para um manifesto funk zombar dos branquelos da guitarra. Perdeu, playboy.