Orquestra Imperial | Fazendo As Pazes Com o Swing

Orquestra Imperial

Fazendo As Pazes Com O Swing

[Ping-Pong Discos; 2012]

4.0

ENCONTRE: Site oficial

por Rafael Abreu; 07/11/2012

Ao vivo, a Orquestra Imperial é um baile. Como se estivesse em um show de auditório antigo, com doses de sons de improviso e convidados planejados, a banda toda vai mudando as posições, os instrumentos, os vocais, o repertório. Diverte e se diverte. Na última vez em que vi a big band, num show de namorados no Circo Voador, todos no palco estavam fantasiados – Domenico com um roupão impagável à Tigrão, da turma do Ursinho Pooh – e tocavam com a mesma destreza “Tamancas do Cateretê”, presente neste novo disco, quanto marchinhas antigas como “Touradas em Madrid”. Tudo muito extravagante e desenvolto. Um affair tropicalista, enfim.

E é a verdade das apresentações ao vivo o que surpreende o ouvinte por retrocesso, quando chega ao ouvido “Fazendo as Pazes com o Swing”, primeiro disco do supergrupo desde a estreia com “Carnaval Só Ano que Vem” em 2005. De lá pra cá, poucos shows, muitos projetos paralelos, o aniversário de uma década de formação e a morte por câncer de um de seus membros mais importantes, Nelson Jacobina – de lá pra cá, pouca coisa nova com relação à sonoridade.

A Orquestra Imperial ainda é uma espécie de brincadeira levada a sério, um grupo cuja música parece sair como se Rodrigo Amarante, Thalma de Freitas, Wilson das Neves, Kassin & cia. estivessem fazendo música para si mesmos, não necessariamente no melhor dos sentidos. Como no show, ao longo de “Fazendo as Pazes com o Swing” todos se mandam beijos, trocam sorrisos satisfeitos, fazem piadas internas, riem dos próprios tropeços – masturbam-se, enfim, diante da delícia que deve ser fazer música entre amigos. Todas as músicas aqui incluem algum tipo de autoindulgência, ainda que a metáfora masturbatória soe um tanto mais dura do que deveria.

Em sua maioria, “Fazendo as Pazes com o Swing” é um disco de salão. De sambas, boleros e lentos trópicos eletrizados pela “modernidade” de um Brasil globalizado. O que talvez a banda não previsse, nesse processo, é que a proposta atravessada de pluralismo cultural que a fez nascer se convertesse numa espécie de conciliação, na entrega dos pontos à uma lógica que, apesar de radiofônica, perde o que esse tipo de pop tem de melhor. A maior parte do disco é formada por faixas em que a Orquestra parece, além de contente, simplesmente contentada: ao fazer música simplesmente OK, porém lúdica – as composições são medianas, a roupagem é esperta – nos timbres e na dinâmica de gravação; ao cavar fundo em rebolado estereotípico, numa lógica em que a execução do gênero, sem inventividade, se basta; e ao tocar, enfim, canções de rádio que não ultrapassam a materialidade do aparelho.

Música que chega, passa, surpreende uns poucos, a caminho do trabalho, e vai embora logo em seguida.Foi-se a transmissão, foi-se a memória. “Enquanto a Gente Namora”, por exemplo, de Thalma e João Donato, inclui uma dose de sensualidade, mas o erotismo suave, aqui, é raso. Brochado, de fato. Quando ela canta “Deixe-se derreter com o absurdo”, a última coisa em que se pensa é o inesperado, ou ao menos o soco no estômago que, por qualidade, até certas familiaridades acarretam. “Moléculas”, com o início eletrônico e os metais dissonantes, em golpes estranhos, se desatam num suingue só gostosinho e assobiável. E é nesse sentido que “Fazendo as Pazes com o Swing”, absolutamente radiofônico, perde o que o pop tem de melhor: partindo da despretensão de fazer qualquer pesquisa sonora, a Orquestra não faz um disco nem inovador nem vigoroso em sua familiaridade. Faz mais um disco prescrito, um produto que se daria bem em contexto de exportação – é docinho, reforça alguns dos clichês de nós, brasileiros, nossa imagem reduzida e obrigada a ser simplesmente tropical, e, não ultrajando ninguém, serve de bom objeto de estimação para gringos cheios de culpa de primeiro mundo.

“Fazendo as Pazes com o Swing” é um disco agradável, até – não dói. Mas seria isso suficiente? Não sei vocês, mas eu, da minha parte, me incomodo um tanto quando um álbum me inspira simplesmente um baixo nível de rejeição, em vez da afirmação sonora de alguma força. Discos, nesse sentido, podem ser “nãos”, maiores ou menores. Música que fica, por outro lado, é apenas “sim”.